Por Thiago Duca

A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.950.577-SP de relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 3/10/2023, ratificou o entendimento [1] de que o artigo 9º da Lei nº 9.249/95 não impõe limitação temporal para a dedução de juros sobre capital próprio (JCP) apurados em exercícios anteriores.

No caso dos autos, a pessoa jurídica apurou valores de JCP relativos aos anos de 2008 a 2011, mas o creditamento em favor dos sócios, e a consequente dedução, operacionalizou-se apenas nos exercícios de 2010 e 2011.

A autoridade fazendária glosou as deduções, lavrando o respectivo auto de infração sob o argumento de que “a recorrida efetuou o pagamento, em 2010 e 2011, de juros sobre o capital próprio calculados sobre o patrimônio líquido dos anos — calendário de 2008 e 2009. Essa conduta implica violação ao regime de competência, por deduzir do resultado tributável dos anos — calendário de 2010 e 2011 encargos com juros incidentes sobre o patrimônio líquido dos anos — calendário de 2008 e 2009”.

Modalidade de remuneração

Os juros sobre o capital próprio (JCP) representam uma modalidade de remuneração destinada aos sócios ou acionistas de uma sociedade empresária que permite a percepção de rendimento equivalente ao que receberia se buscasse outra aplicação financeira de longo prazo. Assim, consoante a disciplina do artigo 9° da Lei n° 9.249/1995, a sociedade paga uma remuneração a seus acionistas e reconhece o valor como uma despesa dedutível, abatendo-a de seu lucro tributável.

A controvérsia central entre Fisco e contribuintes gira em torno do momento em que a dedução das despesas relacionadas ao pagamento ou crédito de juros sobre capital próprio pode ser efetuada.

Nestes casos, o entendimento adotado pela Receita Federal do Brasil segue o racional de que a dedução do JCP só pode ocorrer no exercício em que foram apurados, sob pena de violação aos limites legais de deduções previstos para determinado ano calendário.

Assim, na apuração do lucro líquido do exercício, os valores destinados aos sócios como remuneração do capital devem compor o lucro contábil da entidade, implicando, necessariamente, em reconhecê-los como integrantes do resultado do exercício da sociedade como despesa, não se admitindo que sejam incorridos apenas no momento em que sejam deliberadas as destinações dos lucros;

Os contribuintes, por sua vez, advogam a tese da legalidade da dedutibilidade de juros sobre capital próprio relativos a exercícios anteriores, pois:

  • não há qualquer vedação na Lei nº 9.249/95 quanto ao pagamento acumulado de juros sobre o capital próprio
  • a única limitação ao JCP calculado pela entidade está previsto no §1º do artigo 9º da Lei nº 9.249/95, qual seja, o pagamento ou crédito do JCP condicionado a existência de lucros, computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros, em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados .

No que tange a essa questão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiteradamente se posicionado a favor da possibilidade de dedução, conforme evidenciado nos seguintes precedentes: REsp 1.086.752/PR, relator ministro Francisco Falcão, 1ª Turma, julgado em 17/2/2009, DJe 11/3/2009; REsp 1.939.282/CE, relator ministro Humberto Martins, DJe 10/10/2022.

A corte ressaltou que o pagamento de JCP referente a exercícios anteriores não caracteriza burla ao limite legal de dedução do exercício, desde que, ao serem apurados, seja observada a variação pro rata die da taxa de juros de longo prazo (TJLP) sobre o patrimônio líquido de cada ano. Além disso, o pagamento deve ser limitado ao valor correspondente a 50% do lucro líquido em que ocorre o pagamento ou a 50% dos lucros acumulados e reservas de lucros.

O julgamento do STJ consolida a interpretação de que a legislação tributária não estabelece restrições temporais para a dedução de JCP referentes a exercícios anteriores. Ademais, destaca a importância de observar as condições e limites legais para garantir a regularidade fiscal das operações, proporcionando segurança jurídica aos contribuintes.

Referências
STJ. 2ª Turma. REsp 1.950.577-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 3/10/2023

STJ. 2ª Turma. REsp 1.946.363-SP, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 22/11/2022


[1] REsp 1.946.363-SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por maioria, julgado em 22/11/2022.