Congressistas apresentam propostas para mudar efeitos de decisão recente da Corte sobre “coisa julgada”; Roberto Barroso contesta interpretação de deputados

Deputados querem rever resultado de um julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre decisões definitivas em causas tributárias. Em 8 de fevereiro, o Supremo estabeleceu que a chamada “coisa julgada” –quando não cabe mais recurso– envolvendo tributos recolhidos de forma continuada é anulada quando a Corte definir em novos julgamentos que o tributo é válido.

No Supremo, entretanto, a opinião majoritária é diferente da adotada pelos congressistas. O vice-presidente da Corte, Roberto Barroso, enviou ao Poder360 uma análise sobre a decisão a respeito do CSLL. Leia mais abaixo.

O julgamento analisou o caso da cobrança da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), mas a tese servirá para todos os impostos. Na prática, decisões judiciais que livravam pagadores de impostos e empresas de pagar a contribuição não valem mais a partir da definição do STF.

A votação foi unânime entre os ministros na definição da cobrança. Mas, além disso, a Suprema Corte também definiu por maioria simples –em um placar de 6 a 5– que a quebra da “coisa julgada” deve ser automática, a partir da data em que a Corte julgar pela constitucionalidade do imposto.

Com isso, a Receita Federal e a Fazenda ficam autorizadas a cobrar a contribuição de empresas que deixaram de recolher o tributo nos últimos 16 anos. Isso porque em 2007 o STF já havia estabelecido a constitucionalidade da CSLL (ADI 15, de 1989). O mesmo tema já havia sido discutido pela Corte também em 1992, no mesmo sentido (RE 146733).

Levantamento do Poder360 mostra que há na Câmara dos Deputados ao menos 7 projetos de lei apresentados relacionados à decisão do STF e uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) em fase de recolhimento de assinaturas.

Em geral, as propostas são contrárias à retroatividade da cobrança de tributos. Nas justificativas, deputados criticam a insegurança jurídica e a falta de previsibilidade trazida com a decisão do Supremo.

Roberto Barroso argumentou que a interpretação que está sendo feita pelos congressistas é equivocada: “No caso específico, desde 2007 havia decisão do STF dizendo que a CSLL era devida por todos os contribuintes. A partir dali todos teriam que pagar. A maior parte das empresas passou a cumprir. Algumas insistiram em descumprir, invocando uma coisa julgada que, em relações de trato sucessivo, não pode prevalecer a partir do momento em que pacificado pelo STF que o tributo era devido”.

Barroso elencou em 3 tópicos por que considera que a interpretação não é a mais correta:

  • relação jurídica tributária de trato continuado: “Relação jurídica de trato continuado é aquela que ser renova periodicamente. Por exemplo, o Imposto de Renda: você paga a cada ano e se as regras mudarem, você se sujeita a elas”;
  • efeitos futuros de decisão do STF: “Alguém obtém uma decisão de um juiz ou tribunal, por exemplo, no sentido de que um tributo não é devido por ser a lei que o criou inconstitucional. A decisão transita em julgado. Tempos depois, o STF julga o tema e considera que a lei é constitucional e o tributo devido. A partir daí –vale dizer, para frente– todo mundo tem que passar a pagar, mesmo quem obtivera decisão favorável”;
  • igualdade entre contribuintes: “Do contrário, o contribuinte que obteve uma decisão errada, que lhe era favorável, passa a ter, por toda a vida, uma vantagem competitiva sobre os seus concorrentes”.

No Congresso, uma das propostas que busca apoio dos deputados é a PEC do deputado Fábio Garcia (União Brasil-MT). O texto é mais amplo e determina a necessidade de quorum qualificado de 2/3 dos integrantes de tribunais superiores em discussões que já tenham jurisprudência firmada pelo STF e pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).

“O problema é o precedente. Ele é muito mais amplo do que simplesmente falar de empresas que deixaram de recolher contribuição social e, portanto, estão vulneráveis. Essa decisão sobre a matéria de contribuição social pode vir em outras matérias tributárias, pode vir em outras esferas também, trabalhista, civil, portanto, o problema é o precedente”, declarou Garcia.

O deputado já tinha alcançado 79 assinaturas até a tarde de 6ª feira (17.mar). Para ser protocolada e começar a tramitar, a PEC precisa de 171 apoios (1/3 do total de deputados).

O ministro Gilmar Mendes, do STF, contestou o argumento sobre a insegurança jurídica em evento público, 1 mês depois do julgamento. “No Brasil, como vocês sabem, até o passado é incerto. Recentemente, estavam tentando desenterrar uma causa que já fora definida em 89, em 92 e em 2007. Agora, descobriram uma causa de um laboratório jurídico e estavam fazendo renascer um defunto”, disse o ministro, em referência à causa.

PROPOSTAS NA CÂMARA

Um dos primeiros a apresentar propostas sobre o assunto foi o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ). “Precisamos resguardar a confiança e previsibilidade aos processos legais sobre tributos”, afirmou em seu perfil no Twitter.

Todos os projetos aguardam o despacho do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Com a instalação das comissões permanentes na 4ª feira (15.mar), Lira poderá agora distribuir os textos para a análise dos colegiados.

Leia lista de projetos sobre o assunto:

  • PL 508 de 2023, do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ): determina que as resoluções julgadas pelo STF não poderão ser retroativas, valendo só para casos futuros;
  • PL 512 de 2023, do deputado Gilson Marques (Novo-SC): cria programa de renegociação de dívidas tributárias com a União para quem foi afetado pela decisão do STF;
  • PL 580 de 2023, do deputado Gilson Marques (Novo-SC): determina que a reversão de decisão favorável ao pagador de impostos dependerá de ação rescisória proposta pela União;
  • PL 878 de 2023, do deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS): impede que a revisão sobre decisão transitada em julgado possa retroagir;
  • PL 1.097 de 2023, do deputado Fábio Garcia (União Brasil-MT): com o texto semelhante ao da PEC, exige a necessidade de quórum qualificado para decisões do tipo e determina que efeitos valem somente depois de definidas as decisões que a implementam;
  • PL 1.034 de 2023, do deputado Zé Vítor (PL-MG): concede remissão dos débitos de CSLL até 31 de dezembro de 2022, cujo recolhimento tenha sido dispensado por sentenças transitadas em julgado;
  • PL 26 de 2023, do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ): estabelece que o pagador de imposto afetado pela decisão do STF poderão negociar os valores exigíveis e pagar só o valor principal do débito, sem juros, multas e encargos.

Fonte: PODER360